OPERADORAS NÃO PODEM AUMENTAR O VALOR DO PLANO DE SAÚDE DE PESSOAS MAIORES DE 60 ANOS

Publicado por janeiro 16, 2017 em PHD Contabilidade No Comments

O presente artigo trata do aumento do valor do plano de saúde para pessoas com ou acima de 60 anos de idade. Discute-se a legalidade do reajuste tendo em vista as disposições do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) e do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03).

A Lei nº 9.961/2000, que criou a Agência Nacional de Saúde – ANS, atribuiu à referida autarquia a responsabilidade de controlar os aumentos de mensalidade dos planos de saúde oferecidos no mercado (art. 4º, incisos XVII e XVIII).

O controle exercido pela ANS varia de acordo com o tipo de contrato de prestação de serviços analisado, devendo ser destacadas duas hipóteses em que o reajuste promovido pela operadora independe de prévia autorização da ANS:

A primeira delas refere-se aos chamados “planos antigos”, que são aqueles firmados antes de 02.01.1999 e que não foram adaptados à Lei nº 9.656/98. Em casos tais, a ANS entende que os reajustes devem seguir os termos do contrato. A segunda hipótese se dá com os chamados planos coletivos, que são aqueles contratados pelo empregador, sindicato ou associação em prol dos empregados, filiados ou associados. Nesses casos, os reajustes não são definidos pela ANS, que se limita acompanhar os aumentos das mensalidades.

Não se pode duvidar que mesmo nas hipóteses mencionadas acima, em que está dispensada autorização prévia da Agência Reguladora (ANS) para a aplicação do reajuste, estamos diante de relação de consumo, incidindo sobre estas as normas protetivas contidas no Código de Defesa do Consumidor, em virtude da perfeita adequação aos conceitos de consumidor (art. 2º), fornecedor (art. 3º, caput) e serviço (art. 3º, § 2º), contidos na Lei 8.078/90.

Assim, em que pese a desnecessidade de prévia autorização da ANS para reajustes em planos “antigos” e coletivos, tal conclusão não afasta a possibilidade de reconhecimento de onerosidade excessiva e de abusividade do reajuste praticado, ante a incidência das regras consumeristas à hipótese.

Importante destacar ainda que a Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) encerra matéria de ordem pública, sendo perfeitamente aplicável aos efeitos futuros dos atos e negócios jurídicos formados anteriormente à sua vigência.

Nesse sentido, o enunciado nº 214 da Súmula do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:

“A vedação do reajuste de seguro saúde, em razão de alteração de faixa etária, aplica se aos contratos anteriores ao Estatuto do Idoso” (REFERÊNCIA: Processo Administrativo nº. 0013657 24.2011.8.19.0000 Julgamento em 22/11//2010 Relator: Desembargadora Leila Mariano. Votação unânime).

Urge ressaltar ainda que a Lei 10.741/03 estipula como idosa a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos (art. 1º), assim, a nosso ver, o reajuste praticado logo após uma pessoa se tornar sexagenária revela-se abusivo e contrário ao ordenamento jurídico, devendo ser rechaçado pelo Poder Judiciário.

O estatuto do idoso em seu art. 15, §3º, dispõe que “é vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”.

Não diverge desse entendimento a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:

Apelação. Contrato de plano de saúde. Pretensão de anulação de cláusula de reajuste por mudança de faixa etária. Idoso. Sentença de procedência do pedido. Mensalidades do plano de saúde do autor que somente podem sofrer o reajuste autorizado pela ANS. Vedação introduzida pelo artigo 15, § 3º, da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), de discriminação do idoso nos planos de saúde, em razão da cobrança de reajustes diferenciados em decorrência da idade. Devolução dos valores pagos a maior. Precedentes. Recurso com seguimento negado autorizado pelo caput do art.557, do CPC. (0054949-88.2008.8.19.0001 – APELACAO – DES. KATYA MONNERAT – Julgamento: 08/08/2011 – SETIMA CAMARA CIVEL)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PLANO DE SAÚDE. REAJUSTE DA MEN-SALIDADE POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. CON-TRATO ANTERIOR AO ESTATUTO DO IDOSO. PROCE-DÊNCIA DO PEDIDO. IRRESIGNAÇÃO DA EMPRESA RÉ. CLÁUSULA CONTRATUAL QUE SE AFIGURA NULA POR VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 15, § 3º DO ESTATU-TO DO IDOSO E SUBSIDIARIAMENTE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS A MAIOR QUE SE IMPÕE, NOS TERMOS DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC.RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO, NA FORMA DO ART. 557, CAPUT, CPC. (0027032-36.2004.8.19.0001 – APELACAO – DES. FERNANDO CER-QUEIRA – Julgamento: 08/08/2011 – DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL) CIVIL E CONSUMIDOR. PLANO DE SAUDE. AUMENTO POR FAIXA ETÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. Reajuste de mensalidade em decorrência da mudança de faixa etária. Estatuto do idoso vigente ao tempo dos fatos. Proibição de cobrança de valores diferenciados em razão da idade (art. 15, § 3º). Devolução dos valores indevidamente cobrados. Meros transtornos e aborrecimentos. Inocorrência de dano moral. Sentença que nesse sentido apontou incensurável, recurso manifestamente improcedente, negativa de seguimento. CPC, art. 557, caput. (0006909-50.2005.8.19.0011 – APELACAO – DES. MARILIA DE CASTRO. (grifei)

 0038646-62.2014.8.19.0203 – APELACAO – JDS. DES. MARCELO MARINHO – Julgamento: 02/05/2016 – VIGESIMA SETIMA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR – AG INTERNO – IMPROVIMENTO Apelação Cível. Reajuste de plano de saúde. Desnecessidade de prévia autorização da ANS, que não afasta a verificação de abusividade da cláusula contratual, com base no CDC. Vedação ao reajuste por faixa etária que se extrai do art. 15, §3º da Lei nº 10.741/03 e do art. 3º, IV, da CF. Abusividade do reajuste sob o pretexto de aumento de sinistralidade, desprovido de prova do cálculo atuarial contábil pertinente. Pacífica jurisprudência do TJ/RJ sobre o tema. Condenação da seguradora a promover a devolução dos valores indevidamente pagos pelos segurados, além de indenização a título de danos morais. 1. O Estatuto do Idoso encerra matéria de ordem pública, sendo perfeitamente aplicável aos efeitos futuros dos atos e negócios jurídicos formados anteriormente à sua vigência. Aplicação da Súmula nº 214 desta Corte: “A vedação do reajuste de seguro saúde, em razão de alteração de faixa etária, aplica se aos contratos anteriores ao Estatuto do Idoso”. 2. Urge ressaltar que, apesar de a Lei 10.741/03 estipular como idosa a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos (art. 1º), isso não significa dizer que o Direito deve se coadunar com a prática de condutas manifestamente abusivas, que visem a burlar o espírito protetivo idealizado pelo legislador com a edição do Estatuto do Idoso. Com efeito, o reajuste praticado às vésperas de uma pessoa se tornar sexagenária revela-se abusivo e contrário ao ordenamento jurídico, devendo ser rechaçado pelo Poder Judiciário. 3. Prevalência das normas constitucionais (art. 3º, IV, CF), legais (art. 15, §3º, da Lei nº 10.741/03) e dos deveres anexos, colaterais ou fiduciários inerentes a todo e qualquer contrato sobre o vetusto princípio da obrigatoriedade, de modo a melhor proteger a parte que teve a sua legítima confiança frustrada por ato da outra. 4. Dever de ressarcir, em dobro, a quantia excedente paga pelos autores (art. 42, parágrafo único, do CDC). Dano moral arbitrado em R$ 10.000,00. 5. PROVIMENTO DO APELO AUTORAL PARA DETERMINAR A DEVOLUÇÃO EM DOBRO DAS PARCELAS INDEVIDAMENTE COBRADAS E AO PAGAMENTO DE DANOS MORAIS.

0166043-31.2014.8.19.0001 – APELACAODES. MONICA FELDMAN DE MATTOS – Julgamento: 03/03/2016 – VIGESIMA SETIMA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR – AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. INEXISTÊNCIA DE NOVO ARGUMENTO CAPAZ DE ALTERAR A DECISÃO, QUE ASSIM RESTOU EMENTADA: “APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. REAJUSTE DE MENSALIDADE EM RAZÃO DA MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. IDOSO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AOS CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE. SÚMULA Nº 469 DO EG. STJ. INCIDÊNCIA TAMBÉM DO ESTATUTO DO IDOSO, QUE POR SER NORMA DE ORDEM PÚBLICA E INTERESSE SOCIAL, APLICA-SE DE IMEDIATO. SÚMULA Nº 214 DESTE TJERJ. VEDAÇÃO À DISCRIMINAÇÃO DA PESSOA IDOSA, COM A COBRANÇA DE VALORES DIFERENCIADOS EM RAZÃO DA IDADE. ART. 15, § 3º DA LEI Nº 10.741/03. AUMENTO QUE SE MOSTRA ABUSIVO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO ART. 557, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.” DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO.

Portanto, é imperioso concluir que o reajuste do valor da mensalidade do plano de saúde em razão de ter o usuário completado 60 anos de idade é ILEGAL e ABUSIVO, seja o plano individual, coletivo ou aqueles firmados antes de 02.01.1999, devendo ser declarada NULA a cláusula contratual que preveja a possibilidade de tal reajuste.

O usuário de plano de saúde que tenha sido vítima de tal prática pode vindicar a devolução em dobro (art. 42 da Lei 8078/90 c/c art. 940 do Código Civil) dos valores injustamente cobrados durante os últimos cinco anos.

A Dra. Joanna Salles é contabilista e advogada no escritório Salles & Trugilho Advogados Associados, e, instrutora de Legislação Trabalhista e de Direitos do Consumidor no SENAC/RJ. É Pós Graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo IBMEC/RJ.

Post a Comment

Your email is never published or shared. Required fields are marked *